A percepção do adulto sobre o sujeito criança na perspectiva de Wallon
“Para a
criança, só é possível viver sua infância. Conhecê-la compete ao adulto.
Contudo, o que irá predominar nesse conhecimento, o ponto de vista do adulto ou
o da criança?”. (Wallon)
| Alunos da Professora Solange em atividade livre, no pátio da escola. |
Toda
visão sobre a criança é sempre uma visão do adulto, sobre tudo o que as afeta.
O diálogo adulto/criança só será possível se ao invés de colocar respostas em
sua boca, o primeiro for capaz de deixar o segundo se manifestar, de forma
livre e espontânea.
Historicamente,
o homem sempre destacou a si mesmo em seus objetos de conhecimento, atribuindo
significado e sentido em função do modo como os fenômenos o afetavam e
continuam afetando, nos dias atuais. Deste modo, é de se esperar que um estudo
sobre a infância seja sempre um estudo na perspectiva do olhar do adulto sobre
a criança, em função de suas expectativas, na razão de que esta se torne
semelhante a ele, num futuro próximo, ou atenda a um ideal projetado no
presente. Este olhar supõe que na criança possa ser plantado essa semente do
devir, como algo previsível.
O
processo de conhecimento sobre o sujeito criança se faz, conforme Wallon,
através do modo como o homem atribui a este objeto de conhecimento um olhar
sobre a infância, na perspectiva do adulto, ou seja, uma visão adultocêntrica.
A visão
sobre o ser criança será, portanto, uma interpretação do que se imagina ser a
criança, num dado momento de sua vida. Uma interpretação sobre seu modo de
pensar, agir, existir e refletir. Será sempre uma visão aproximada, e,
possivelmente, distorcida da criança real.
Sobre
essa visão adultocêntrica, Wallon em A evolução psicológica da criança, destaca:
“A
criança, cujo crescimento ele vigia, guia e a quem muitas vezes lhe parece
difícil atribuir motivos ou sentimentos complementares aos seus. Para o seu
antropomorfismo espontâneo, quantas oportunidades, quantos pretextos, quantas
aparentes justificativas! Sua solicitude é um diálogo em que ele completa as
respostas que não obtém mediante um esforço de intuitiva simpatia, em que
interpreta os menores indícios, em que acredita poder preencher manifestações
lacunares e inconsistentes remetendo-se a um sistema de referências, feito de
quê? Dos interesses que ele sabe serem os da criança e em relação aos quais lhe
empresta uma consciência mais ou menos obscura, das predestinações cuja
promessa gostaria de confirmar nela, dos hábitos, conveniências mentais ou
sociais com as quais ele mesmo se identificou em maior ou menor medida, e
também das lembranças que imagina ter guardado de sua própria infância.
Sabemos, porém, que nossas primeiras lembranças variam com a idade em que são
evocadas, e que toda lembrança trabalha em nós sob a influência de nossa
evolução psíquica, de nossas disposições e das situações. A menos que esteja
solidamente inserida num complexo de circunstâncias objetivamente
identificáveis, o que raramente ocorre quando sua origem é infantil, é muito
mais provável que uma lembrança seja a imagem do presente e não do passado. É
assim, assimilando-a a si, que o adulto pretende penetrar a alma da criança.”(Wallon, 2007)
Nesse
sentido, há que se ter muita sensibilidade ao lidar com a criança, cuja imagem
está longe de representar uma cópia em miniatura do adulto, embora, sua
capacidade de imitá-lo possa levá-lo a essa crença. Para tanto, o
estabelecimento de um diálogo e não monólogo; a construção de espaços para a
manifestação espontânea e livre das crianças, dotados de estruturas e
estímulos, são essenciais para que esta possa dizer o que pensa, sente e
deseja, ao mesmo tempo, em que assimila os valores de sua cultura, assim como,
os conhecimentos, historicamente,
acumulados. No momento em que sua capacidade de verbalização e maturidade não
lhe permite fazê-lo, de outro modo.
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